Decreto sobre posse de armas de Bolsonaro é “inconstitucional”, diz órgão do MPF


Foto: Ueslei Marcelino (Reuters)
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão enviou nesta sexta-feira uma representação à procuradora-geral da República, Raquel Dodge, alegando que as mudanças na concessão da posse de armas aprovadas pelo presidente Jair Bolsonaro são “inconstitucionais”. No texto, a entidade, que é ligada ao Ministério Público Federal, afirma que o decreto assinado pelo capitão na terça-feira “amplia de modo ilegal e inconstitucional as hipóteses de registro, posse e comercialização de armas de fogo, além de comprometer a política de segurança pública”. Agora cabe a Dodge analisar se leva a questão ao Supremo Tribunal Federal, para que a Corte delibere sobre o assunto.

O decreto de Bolsonaro foi seu principal aceno ao eleitorado e à bancada da bala do Congresso desde que tomou posse este ano. A ampliação da posse (possibilidade de ter armas em casa) e porte (andar armado) foram bandeiras de campanha do militar.

No texto encaminhado para Dodge os procuradores afirmam que o decreto representa uma “usurpação da função legislativa pelo poder Executivo, o que afronta o princípio da separação de poderes”. Além disso, o decreto de Bolsonaro “enfraquece as atribuições da Polícia Federal quanto ao exame dos fundamentos de necessidade de porte de arma na declaração”.

Um dos principais pontos contestados pela Procuradoria foi a ampliação do escopo do que viria a ser efetiva necessidade — uma justificativa necessária para que a Polícia Federal autorize a posse. O texto do decreto considera que “residentes em área rural”, “residentes em áreas urbanas com elevados índices de violência”, ou seja, localizadas em Estados com índices de homicídio que superam dez por 100.000 habitantes e “titulares ou responsáveis legais de estabelecimentos comerciais ou industriais” se enquadram na descrição de efetiva necessidade. Na representação os procuradores alegam que com esta mudança, "fica presumido que todos os residentes podem solicitar a posse".

"A iniciativa de ampliar a posse de armas de fogo reforça práticas que jamais produziram bons resultados no Brasil ou em outros países. Sua adoção sem discussão pública, ademais, atropela o processo em andamento de implantação do Sistema Único de Segurança Pública - SUSP, fruto de longa discussão democrática e caminho para uma redefinição construtiva do modo de produzir segurança pública no País", ressaltam os procuradores Deborah Duprat e Marlon Alberto Weichert. De acordo com eles, "as próprias autoridades de segurança pública rotineiramente orientam que a posse de uma arma de fogo aumenta o risco de vitimização letal do cidadão que sofre uma abordagem criminosa".

O pedido enviado a Dodge finaliza citando números da violência no Brasil: "Espera-se do Estado brasileiro, em todos nos níveis federativos, um efetivo, articulado e profissional esforço para enfrentar a inaceitável situação de uma violência endêmica que ceifa, anualmente, mais de 60.000 vidas no País. Para problemas difíceis não há soluções fáceis".

Esta não é a primeira movimentação contra o decreto de Bolsonaro. Na quinta-feira o núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo acionou o MPF para que ele se mobilize no sentido de anular o texto do capitão. Eles alegam que alterações deste porte no Estatuto do Desarmamento só poderiam ser feitas via Congresso. Além da defensoria, PT e PSOL também afirmaram que devem acionar o Supremo para tentar derrubar o decreto.
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