© Divulgação/SOS Animais Itapetinga
O registro de novos casos de maus-tratos envolvendo jumentos na Bahia, estado recordista no abate dos animais no país, acendeu o alerta das autoridades -em diversas propriedades rurais, fiscais flagraram nos últimos meses uma série de irregularidades.
Entre os problemas encontrados estão o confinamento em espaços lotados, ausência de alimentação, falta de água, animais feridos e, até mesmo, o aborto forçado de fêmeas.
Os jumentos abatidos na Bahia e são exportados principalmente para a China e para Hong Kong (território semiautônomo que pertence ao governo chinês), onde a indústria extrai do couro e da pele do animal uma substância utilizada para produzir o ejiao -remédio que promete combater o envelhecimento, aumentar a libido nas mulheres e reduzir doenças do órgão reprodutor feminino.
Mais de 200 jumentos foram encontrados pela polícia sob condições degradantes de confinamento, antes de serem enviados para o abate em frigoríficos, em pelo menos três municípios baianos: Itatim, Paulo Afonso e Rodelas.
No ano passado, o estado, com apenas três frigoríficos licenciados pelo Serviço de Inspeção Federal do Ministério da Agricultura, liderou os abates legais de equídeos, com 45.624 animais mortos, à frente de Rio Grande do Sul (12.014) e Minas Gerais (7.076).
O caso mais recente de maus-tratos foi registrado em 10 de julho, em Itatim (a 230 km de Salvador), quando a Polícia Militar, acionada pela Associação de Protetores dos Animais, flagrou a situação na fazendo Boa Esperança, localizada às margens da BR-116.
Responsável pela ação, o tenente Benjamim Silva disse ter se deparado com um cenário de terror ao encontrar cerca de 200 animais no curral da propriedade, que seria "alugada por investidores chineses".
"Foi uma cena lamentável. Os animais estavam num curral há mais de um mês, com pouco espaço, feridos, sem água nem alimentação", disse. "Ainda encontramos algumas fêmeas em estágio de aborto ou que já tinham abortado, além de filhotes esquálidos por falta de aleitamento."
Segundo o tenente, antes de enviarem os animais para o abate no frigorífico de Amargosa (BA), grupos chineses costumam contratar uma pessoa para intermediar a compra dos jumentos em outras regiões do país -os animais são inicialmente comprados por até R$ 30 e, depois, revendidos por até R$ 200.
"Ao contrário dos bovinos, como não há fazendas para criação de jumentos a pessoa sai procurando animais que foram abandonados nas cidades ou cujos donos querem se desfazer, porque não servem mais para o trabalho na roça, até juntar um lote de 30, 40 bichos", disse.
Em 29 de abril, segundo a Polícia Civil baiana, 13 animais foram encontrados confinados em uma pequena propriedade de um casal na localidade Xangô, povoado de Açude, no município de Paulo Afonso, extremo norte da Bahia, a 464 km de Salvador.
De lá, os animais viajariam 117 km para se juntarem a um grupo de cerca de 100 jumentos no município de Rodelas, de onde seguiriam por mais 942 km para o abate em Itapetinga, onde fica um dos três frigoríficos credenciados no estado.
No caso de Itatim, após o flagrante policial, o Ministério Público da Bahia disse ter instaurado um processo administrativo, solicitado a instauração de um inquérito policial e acionado o município, que alegou não ter encontrado os animais em diligência feita no dia seguinte.
"Provavelmente todos esses animais foram encaminhados para o abate, porque todos sumiram quando as equipes de fiscalização estiveram novamente na fazenda", disse a presidente da União Defensora dos Animais, Gislene Brandão.
Em relação a Paulo Afonso, os responsáveis foram ouvidos e liberados após a assinatura de um termo circunstanciado, que foi encaminhado ao Ministério Público da Bahia e, posteriormente, remetido ao TJ (Tribunal de Justiça).
"O problema é que precisamos que a punição relacionada a maus-tratos de animais, em geral, seja mais severa para não cair na banalização", disse Brandão. "Mas, primeiro, precisamos que a sociedade civil pressione o Congresso por uma mudança na legislação."
Levantamento recente da USP (Universidade de São Paulo) aponta um aumento de mais de 8.000% no abate de equídeos no país, de 2015 a 2019, ano em que 91.645 foram mortos.
Desde 2017, o abate de equídeos -que inclui jumentos, mulas e cavalos- foi regulamentado pelo decreto presidencial 9013.
Realizado pelos pesquisadores da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP Adroaldo Zanella e Mariana Garneiro o estudo conclui que o ritmo de abate de equídeos coloca em risco a espécie no país, que tem rebanho estimado em 400 mil animais, mas a taxa de reprodução é lenta.
De acordo com o ministério, os animais são abatidos para exportação da carne para países consumidores, como Hong Kong, China e Rússia, mas o estudo também aponta uma demanda por couro e para a produção do eijao –o estudo afirma que não há comprovação científica da eficácia da substância.
Ainda de acordo com informações do ministério, até julho o Brasil arrecadou US$ 9,2 milhões (R$ 47,74 milhões) com a exportação de 3.000 toneladas de carne de equídeos, volume que já se iguala a todo o ano passado, que rendeu US$ 7,9 milhões (R$ 41 milhões) em vendas.
Os principais destinos consumidores, em 2021, foram Hong Kong (54,1%), China (20,1%) e Rússia (14,5%), segundo o governo federal.
Fonte: Notícias ao Minuto
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