Do total de 1.465 mortos pela polícia baiana em 2022, os negros foram 94,76%. Isso é o que revela o novo boletim ‘Pele alvo: a bala não erra o negro’, da Rede de Observatórios da Segurança, que há quatro anos monitora as informações sobre a cor da letalidade causada por ação policial a partir dos dados obtidos junto às secretarias estaduais de segurança pública via Lei de Acesso à Informação (LAI). A publicação ainda aponta que os jovens de 18 a 29 anos representam 74,21% das vítimas.
Os negros foram as principais vítimas da letalidade policial. Esse mesmo grupo representa 80,80% da população da Bahia, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2022. No ponto de vista apresentado no boletim da Rede de Observatórios, a escalada da violência no estado ocorre sob a cortina da guerra às drogas, principal motivação das operações policiais.
“As operações policiais acontecem nos territórios negros e de periferia com a justificativa de guerra às drogas, mas o que vemos, na verdade, é a morte das pessoas. É muito mais sobre as pessoas que vivem nos territórios negros dessa cidade do que sobre as substâncias que está sendo foco da operação. A cor de quem morre não mudou. As drogas circulam por todos os bairros da cidade, mas é somente os moradores e moradoras das áreas periféricas que vão sofrer os efeitos daquelas operações”, destaca Larissa Neves, pesquisadora do Observatório da Bahia.
Quanto a morte de jovens negros nas ações policiais, a pesquisadora aponta que um dos fatores para essa realidade é a visão do estado, que enxerga esses corpos negros como inimigos. “A juventude negra sofre cada vez mais dentro dessa dinâmica da política de guerra às drogas, porque o alvo são meninos adolescentes. A justificativa dessas operações é de que a polícia chegou e foi recebida com balas e houve confronto, mas no final esses corpos são esses jogados no chão”, acrescenta.
Na visão de Lidiane Yoshioka, coordenadora do Movimento Negro Unificado da Bahia (MNU Bahia), faltam políticas públicas no âmbito da educação e trabalho que atinjam efetivamente a juventude negra e a protejam da violência policial. "Esse mal que chega até a essa juventude pode possivelmente causar um buraco geracional na sociedade em virtude da falta que nosso povo vai ter em conseguir chegar à longevidade. Nós temos essa essa dificuldade e pensamos se nossos filhos vão chegar até os 30 ou vão ser exterminados antes", reflete.
O entregador Alexandre dos Santos, 20 anos, o estudante Patrick Sousa Sapucaia, 16, e o vendedor ambulante Cauê Guimarães, sem idade divulgada, foram assassinados em 1º de março de 2022 por ação policial. Segundo testemunhas, os três estavam em um bar quando foram abordados pelos militares, levados até uma casa na mesma comunidade e executados. Já os policiais contaram que foram até o local averiguar uma denúncia, que foram recebidos a tiros e revidaram.
Em dezembro de 2022, Marcelo Daniel Ferreira Santos, 19 anos, um dos homens baleados em ação policial realizada no Nordeste, em Salvador, na véspera do Natal, morreu após receber um tiro no abdômen. Segundo testemunhas, os policiais militares chegaram atirando na localidade do Alto do Capim por volta das 20h30.
Em nota, a Polícia Militar informou que estava fazendo uma ação de intensificação de policiamento na localidade de Serra Verde quando indivíduos armados foram flagrados por equipes da Companhia Independente de Policiamento Tático (CIPT)/ Rondesp Atlântico, dando início a uma troca de tiros.
Em outubro de 2022, um adolescente de 16 anos, identificado como Elielson de Oliveira Sales, morreu após ter sido baleado durante confronto com a Polícia Militar na Praça de Mar Grande, na Ilha de Itaparica, localizada no município de Vera Cruz. Testemunhas disseram que a vítima estava brincando com uma arma de brinquedo e que os militares já chegaram atirando.
A corporação informou que a 5° Companhia Independente da Polícia Militar recebeu denúncias de homens armados traficando drogas na Praça de Mar Grande e que, ao chegarem no local, os PMs se depararam com um grupo de suspeitos que passou a efetuar disparos contra os agentes. Em seguida, houve revide e, após a troca de tiros, foi encontrado um suspeito ferido, que foi imediatamente socorrido para o Hospital Geral de Itaparica, onde não resistiu aos ferimentos.
A Polícia Civil foi procurada para comentar os dados referentes à letalidade policial e para explicar as razões para os negros serem os principais alvos das operações policiais, mas respondeu, por meio de nota, que não comenta dados não oficiais.
A Secretaria de Segurança Pública e a Polícia Militar foram procuradas para o mesmo pedido, mas não responderam até o fechamento desta reportagem.
*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro
Fonte: Correios
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